Contextualização ao extremo

"Novamente Jesus chamou seus discípulos com a proposta de organizarem um lanche pra todo mundo. Jesus sentia a dor daquelas pessoas e não queria mandar ninguém com fome embora, pra não desmaiarem pelo caminho. Os discípulos, boca dura que eram, responderam de maneira ignorante: 'Onde que tem pão pra esse tanto de gente num lugar deserto igual esse?'. Jesus perguntou o que tinham e novamente era uma mixaria: míseros setes pães e uns lambaris. E novamente botou a galera toda sentada e fez aquele lance mágico do McLanche Feliz com os pães e os peixes. No final ainda sobraram sete cestas lotadas de rango."

Se esse texto parece familiar, mas muito esquisito, é porque você já o leu antes, em Mateus 15. Só que, certamente, não com essa linguagem. Trata-se de um trecho da Bíblia Freestyle, versão criada pelo pastor Ariovaldo Carlos Jr., da Igreja Manifesto Missões Urbanas, em Uberlândia (MG), que levou a liberdade de interpretação e contextualização ao extremo. "Essa Bíblia serve para fazer com que pessoas que nunca leriam as Escrituras se interessem pelas histórias bíblicas", garante Ariovaldo, cujo visual inclui tatuagens e brincos. "A Bíblia Freestyle não substitui uma leitura integral do texto original", ressalva. "Mas até o desafio de comparar as versões pode contribuir muito na vida das pessoas desta geração". O resto, garante o religioso, é obra do Espírito Santo.

"CONSERVADOR E REFORMADO"

Ariovaldo diz não ser liberal nem moderninho. "Sou um pastor biblicamente conservador, de base teológica reformada", explica. Na versão Freestyle ("estilo livre"), há, inclusive, palavrões. Só em Mateus, o termo "m..." é usado seis vezes. Vale tudo em nome da contextualização? "Não, não vale. Mas estamos diante de um texto que visa a um público-alvo específico, que não fica vermelho com esse tipo de formulação", afirma o pastor Valdemar Kroker, da Igreja Irmãos Menonitas em Curitiba (PR). Kroker participou da tradução de diferentes bíblias, entre elas a Nova Versão Internacional(NVI) e A Mensagem, da qual fez parte do comitê de revisão exegética. "Não se pode, evidentemente, usar esse tipo de texto para formular doutrinas e sistemas de ensino das verdades bíblicas. Outro perigo seria empregá-lo numa liturgia mais tradicional, desacostumada com essa ousadia."

Nos últimos anos, diversos lançamentos com linguagem coloquial e paráfrases têm chegado ao mercado de bíblias. A Bíblia Freestyle é o exemplo mais radical desse fenômeno. Segundo o pastor Ariovaldo, ela começou como um passatempo. Mas seu objetivo é lançar um capítulo por dia e, mais tarde, uma versão impresssa. 

Até o fechamento desta edição, haviam sido veiculados no site www.bibliafreestyle.com.br o evangelho de Mateus e partes de outros evangelhos. A iniciativa gerou elogios rasgados e críticas ferozes, como se pode ver nos comentários deixados por internautas. O autor não deixa por menos: "Se quer entrar em contato para nos avisar sobre os últimos versículos de Apocalipse, nem perca seu tempo. 

Conhecemos bem as Escrituras. Neste caso, provavelmente mais do que você. Se quer sugerir que a linguagem seja modificada para que se torne menos vulgar, pressione 5 no teclado numérico e aguarde a atendente. Pode demorar. Muito!".

cristianismohoje.com.br

Comentários